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Para Galileu

8 de abril: Dia Mundial da Astronomia! No 99º giro da Terra em torno de si mesma em 2020, escrevemos uma carta para o pai da ciência moderna! O assunto? A Ciência e os tempos que vivemos.


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Para Galileu

Nascido em 1564 em Pisa, na Itália, Galileu Galilei é considerado pai da ciência moderna. Foi astrônomo, matemático, filósofo e responsável por uma série de contribuições e descobertas importantíssimas para a humanidade.

Conta a tradição que o revolucionário e desafiador cientista, perseguido e julgado pela Inquisição da Igreja Católica, foi obrigado a renegar sua visão heliocêntrica do Universo – com o Sol ao centro dele e os planetas se movendo ao seu redor. Na época, a teoria aceita era o geocentrismo, que considerava a Terra fixa ao centro de tudo.

Logo após admitir que estava errado perante o tribunal, Galileu teria pronunciado baixinho a frase “E pur si muove!”, que, em português, significa, “No entanto, ela se move!”.


Caro Galileu,

Hoje, no 99º giro da Terra ao próprio redor em 2020, é comemorado o Dia Mundial da Astronomia! Oportunidade ímpar para que eu, em nome dos meus, faça um desabafo e peça perdão. Pecamos!

Como exemplar do Homo sapiens no terceiro milênio, agoniza assistir ao tratamento dado por parte de meus semelhantes à Ciência. Para começo de conversa, a própria palavra deveria ser, sempre, escrita assim: com C maiúsculo – ou S, no caso da sua Scienza.

Mas quem dera fosse gramatical o problema. São tempos difíceis, na sua Itália, no meu Brasil, na França da minha amiga Amélie e em todo o planeta.

Para não perder o foco e não te preocupar tanto, serei breve na contextualização sobre 2020.

Em resumo, um novo vírus se espalhou rapidamente pelo mundo e ninguém é imune a ele. É difícil comparar com a pandemia de peste bubônica, caso você esteja se perguntando enquanto lê, Galileu. Afinal, em quatro séculos tivemos incontáveis e inestimáveis avanços enquanto sociedade. Você ficaria orgulhoso de nossa amada Ciência! Bom, o correto seria que todos ficássemos. Mas não tem sido bem assim.

Talvez uma interessante semelhança entre a peste e a Covid-19 seja o pânico causado por um inimigo desconhecido.

No nosso caso, já sabemos muito mais do que as pessoas daquela época: a origem do vírus, como se dá o contágio, quem está mais exposto a complicações e de algumas substâncias com potencial para combatê-lo; já existem testes, alguns bastante rápidos e eficazes, e experiências de sucesso de países que conseguiram abafar a disseminação da doença. Ciência.

Mas você acredita, Galileu, que tem gente instruída e poderosa refutando todo esse conhecimento?

A cada dia que passa tiram, sabe-se lá de onde, novas teorias sobre a origem do vírus e curas que não existem ou sem a mínima comprovação. Menosprezam a situação e se recusam a tomar as medidas necessárias para evitar a propagação. Olham para os grupos de risco como casos perdidos, mortes certas e naturais, em vez de acolhê-los. Ignoram atos de sucesso de outros países e os estudos, inclusive econômicos, que apontam que salvar vidas deve ser a única prioridade no momento.

São líderes, Galileu. E levam muita gente com eles nessa toada. Alguns têm interesses escusos. A outros, simplesmente faltam empatia e humanidade. Os piores de todos são os que acumulam essas duas enfermidades, que deveriam causar tanto pânico quanto a motivada pelo vírus.

Lembra daquela história de direito divino que um pessoal inventou e usava para justificar os privilégios enquanto a maioria estava condenada à miséria e à servidão para o resto da vida? Pois é, até hoje a mentira é usada para justificar o injustificável.

Hoje, porém, as histórias são mais bem forjadas e ganharam um canal de alcance global, chamado popularmente de internet. Em instantes, gente em todo canto lê e se torna escrava da mais recente falcatrua. Triste. Perigoso.

Já perdemos muita gente para a pandemia e nos assusta o fato de não sabermos quantos mais nos deixarão. Nos apavora também a falta de definições sobre o futuro. É que a gente se acostumou a planejá-lo e não sabe lidar muito bem com imprevistos e incertezas. Você já ouviu falar de ansiedade? O pior de tudo é ter esse pessoal jogando contra, quando todos poderíamos estar abraçando juntos a Ciência e nos abraçando, mesmo que mentalmente. A falta de unidade e pertencimento dói mais ainda em momentos difíceis.

Nos desculpe por não honrarmos de forma merecida o legado de seres humanos como você, Galileu, que lutou e teimou até o fim em nome do conhecimento, com a certeza de estar certo.

A Terra se move, professor! Ao redor do Sol, mas também em torno dela própria. Sem ficar tonta. Também, pudera! De tontos já basta...

Todo esse movimento nos dá a certeza de viver algo transitório; apesar dos esforços contrários dos que, hoje, fariam parte dos tribunais que perseguiam e puniam quem ousasse pensar, questionar, descobrir; saber.

Sim, vai passar!

Não sei se é uma impressão minha, mas a crise parece servir para muita gente acordar de um sono profundo em berço nada esplêndido – essa referência você não vai pegar, é coisa de brasileiro.

Gosto de pensar que somos maioria e sempre seremos. Ao lado da Ciência e por ela, não deixaremos de lutar.

Uma curiosidade: na sua época ainda havia quem acreditasse que a Terra era plana? Devia ser uma loucura.

Abraços de luz!


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astronomia, galileu galilei, ciência