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Rasteira: um esporte tupiniquim

Tudo às avessas, inclusive a aquisição de experiência no galopar dos anos. Mais velho, em vez de safo, mais inocente ficaste. Ou talvez parara no tempo, enquanto quem o rodeava atingia excelência em performance. Numa modalidade que dia desses constará na carta olímpica de opções: a puxação de saco?!


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Rasteira: um esporte tupiniquim

Tudo às avessas, inclusive a aquisição de experiência no galopar dos anos. Mais velho, em vez de safo, mais inocente ficaste. Tipo um Benjamin Button a trupicar nos próprios calos. Ou talvez parara no tempo, enquanto quem o rodeava atingia excelência em performance... Numa modalidade que dia desses constará na carta olímpica de opções: a Puxação de... Saco?! Não! Sua prima-irmã: a Puxação de Tapete.

É crível o que deveria ser incrível: há quem faz por esporte, especializando-se na isometria dos movimentos para derrubar o outro... Aperfeiçoando-se numa cegueira subvertida, enxergando o outro sempre como rival. Às favas com a redundância no escrevinhado, mais uma vez citemos o tal outro. Se é também praticante do Afano à Tapeçaria, teremos belo embate - digno dos indignos ao Olimpo desportivo. Mas não amador, nem atleta de fim de semana... Então, de onde vem a ânsia na aplicação do ippon, se a faixa do identificado como adversário não é a preta e, sim, a branca da paz coexistencial?

Alguma resposta está no pugilismo laboral. Certas colocações de trabalho se desenham como tatames, ringues e octógonos... Exigindo guarda alta e contragolpes a todo tempo. Elevados níveis de cobrança no início da vida produtiva, atados à inexperiência e ao medo do Passaralho voar, levando empregos nas asas das intempéries mercadológicas... Surtem num treinamento de “altíssimo nível”, cuja sudorese traumática virá a escorrer inoportunamente. Mesmo não ocupando mais aquele posto, salgadas gotas continuam a escorrer na testa. E quando caem nos olhos, os embaçam em autodefesa; aí é tarde pra levantar aquele cujo tapete foi puxado.

Mas sem vitimismos ao derrubado, passando longe do córner mais fraco na arena. Se caíste, foi porque nem sabia que havia uma luta. Embate por microespaços cotidianos, num microcosmos de tramas secretas junto aos demais colegas; aplicando um soco conjunto em alguém cuja leveza é tamanha que, em vez de beijar a lona... Cai pra cima, voando a outras categorias, até mesmo outros esportes, onde sua cabeça sempre esteve. E é por isso que a guarda andava baixa, com o peito aberto, porque ele não estava lá!

Mesmo longínquo, jazia distante do absenteísmo, pois com chuva, sol, ou crises de sinusite: nunca assoava o nariz em atestados médicos. Digamos que sofria de um presenteísmo torto - era um corpo sem cabeça, mas não um defunto em sua mesa. Decapitado, fazia valer o salário, mais até que os conspiradores. Quando veio o cruzado de direita e lhe faltaram tapetes, grudou um sorriso torto de Rocky Balboa no rosto, alimentando-os com a indignação. “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” - Versículos de CREED, Apollo 23 : 34.  

Sobre o Escriba: tá com medo de furarem sua barriga, depois dessa brincadeirinha com os evangelistas Lucas e Stallone.


Tags

crônica, tiago santos-vieira, rasteira


Escrito por

Tiago Santos-Vieira

Escritor e jornalista; é autor dos livros Dança das Bestas, Elos do Mau Agouro e As Aventuras do Super Careca. Foi colaborador das revistas Rolling Stone, Trip/TPM e é brother da Chico Rei.