No Dia da Consciência Negra, o artista Yorhán Araújo, nosso parceiro e autor do projeto "Negros e Negras Incríveis", produziu um conteúdo em primeira pessoa para o Blog da Chico Rei. Yorhán também compartilhou com a gente algumas ilustrações desse projeto que enaltece negros e negras que fazem ou estão fazendo história. Confira, abaixo, o relato do criador das tirinhas “Devaneios com Sigmund e Freud”.
Eu comecei a ilustrar pequeno por influência do meu pai que ilustrava muito, mas nunca trabalhou com isso. Se hoje ainda é difícil uma pessoa negra se destacar no mundo da arte, imagina na época dele, sem internet e sem acesso a qualquer informação. Foi tão complicado que a chave só virou para mim em 2014. Eu tenho 30 anos e comecei mesmo com 25, que foi quando criei as tirinhas "Devaneios com Sigmund e Freud" e só decidi fazer isso porque durante uma noite bebendo com uns amigos, vi que estava seguindo o caminho do meu pai, que gostava muito de algo, mas trabalhava com outra coisa que não curtia.
Na época, eu ainda estava na faculdade de Publicidade e Propaganda e fazia estágio, ganhava pouco para trabalhar, muitas vezes, umas 15 horas, um novo tipo de escravidão, eu diria. Decidi jogar tudo para o alto, afinal, eu não precisaria fazer muitos jobs para ganhar o que eu ganhava naquela agência e se fosse para sofrer, que fosse por algo que eu acreditava, foi aí que comecei a fazer as tirinhas. Elas começaram como um zine digital que tenho até vergonha de mostrar. Vi que uma página postava tirinhas e decidi tentar a sorte. Em 10 minutos eles postaram e eu corri para fazer a página. Eu não acreditava em mim e isso me deu forças para continuar.
Depois criei um projeto experimental chamado "Universos", no qual ilustrava negros e negras com galáxias em seus cabelos, dando a ideia de que cada ser é um universo e que não deveríamos nos rebaixar só porque as pessoas não gostam de cabelos crespos. Assim como não entendemos a grandiosidade do universo, essas pessoas não entendem a nossa grandiosidade. É um projeto de alguns anos, foi em 2016. Hoje, felizmente existe uma aceitação maior. Se bem que aqui na minha cidade, ainda vejo uns marmanjos agindo como crianças e rindo quando olham o meu cabelo ou de outras pessoas, mas nem tudo pode ser perfeito, não é mesmo?
Já em 2018, eu criei o "Negros e Negras Incríveis" que visava enaltecer negros e negras que fazem ou estão fazendo história, já que se depender dos livros e dos espaços, ainda hoje, negros não têm muita vez. Era uma proposta simples, ilustração com o nome e uma frase da pessoa na imagem e uma descrição breve da história. No momento ele está parado, quero reformular um pouco para ficar mais interessante, mas é um projeto do qual tenho muito orgulho.
Para encerrar, eu quero dizer que negros e negras ainda têm dificuldade de acesso aos ambientes. Em qualquer lugar são sempre os primeiros a serem julgados e os últimos a serem escolhidos. Tanto que nos eventos que participo hoje em dia não vejo quase nenhum negro participando. E não é por falta de vontade ou tentativa. Os lugares simplesmente ignoram que existem artistas negros perfeitamente capazes de ocupar o lugar de um artista branco. Falta um pouco de curadoria, já que com acesso à internet fica bem fácil de achar.
Sei que não é fácil. Ser artista já é difícil, ainda mais sendo negro. Precisamos lutar duas ou três vezes mais para ganhar metade da recompensa, mas não é desistindo que conseguimos lutar. Eu tive que correr por fora para estar onde eu estou. Foi graças às páginas que não eram ligadas a quadrinhos, graças à minha insistência e graças às pessoas que gostam do meu trabalho que eu cheguei até aqui. Você não precisa pedir permissão para meio algum para fazer parte: o lugar você pega, já é seu mesmo que ninguém queira!